Casamento do Ano, O |
Basta observar um cartaz de O Casamento do Ano para prever o que estava por vir, numa provável comédia familiar com um elenco estelar que a tornaria mais aguardada e bem sucedida nas bilheterias, como sempre ocorre quando se reúne um grande número de atores renomados. O que acontece não é justamente isto, gerando algo duvidoso.
Até um certo tempo atrás, ver uma reunião entre vários atores renomados num mesmo filme tornava-se um evento para o Cinema naquele ano, mas com isto se tornando cada vez mais comum em grandes produções para tentar alavancar seu sucesso de público e com muitos grandes atores escolhendo mal seus projetos - o que faz sua presença não assegurar mais a qualidade do projeto -, não é mais algo tão animador ver Robert De Niro, Diane Keaton, Susan Sarandon e Robin Williams unidos num elenco - ainda mais pela fase atual de suas carreiras -, o que não assegurou nem a qualidade do longa como sequer trouxe bons resultados de público. A motivação para utilizar estes quatro nomes e alguns outros mais foi simples: A família Griffin tem uma história bem conturbada, o que abrange desde os pais até os filhos, e quando Alejandro (Ben Barnes), um dos filhos, está às vésperas de se casar com Missy (Amanda Seyfried), ele acaba se lembrando de que sua mãe biológica está vindo da Colômbia somente para o evento e também de que ela é extremamente religiosa, assim um conflito ocorrerá caso ele não previna sua família disto, uma vez que seus pais adotivos, Don (De Niro) e Ellie (Keaton), são divorciados, o que seria considerado um pecado grave para sua mãe biológica, e como ele não deseja desapontá-la, Don e Ellie terão que fingir que estão casados por um final de semana, por mais inimaginável que esta proposta possa parecer. Com isto, Bebe (Sarandon), a namorada de Don, será a mais atingida; mas não a única, logo, a resolução do problema original trará uma série de conflitos potencialmente maiores do que o próprio durante o casamento de Alejandro, que talvez seja o menos culpado desta história.
Embora seja necessário se adequar à proposta do longa - que até torna-se interessante por subverter um pouco a impressão inicial que se havia em torno dele -, não há como perdoar uma obra com tantos erros simplesmente por ela ser recebida por aqueles que a defendem como um mero "produto de entretenimento", quando não é; é uma obra de Arte como qualquer filme, mesmo que um de seus principais objetivos seja sim o entretenimento, mas ele não é o único, e portanto, há sérios erros reconhecíveis. Neste caso, deixo claro que o filme funciona sim com o objetivo de divertir, gerando algumas risadas mais pela performance de seu elenco do que pelo roteiro em si, que falha bastante.
A começar pelo simples fato de que basta observar a trama central para notar que há uma americanização excessiva e até certo preconceito contido em todas as bases d'O Casamento do Ano, uma vez que temos toda a família principal tendo que se revirar para suprir a necessidade da visitante que está por vir, ou simplesmente e para deixar as coisas mais claras, temos uma família americana tradicional se esforçando para superar os problemas e empecilhos que uma imigrante os trouxe. Esta visão é tão conservadora que se encaixaria muito melhor numa época em que os principais atores desta fita estavam no auge de suas carreiras, mas o demérito não é único deste filme aqui, afinal, infelizmente ainda está contido na abordagem de diversos longas oriundos do país que também produziu este aqui (vejam só, mais uma categoria em que este tornou-se apenas mais um na lista). A diferença talvez esteja no fato de esta família não ser das mais tradicionais, já que adotaram um filho latino-americano, convivem com questões como o alcoolismo e discutindo sexo deliberadamente na frente de convidados; mas ao mesmo tempo, também provam-se extremamente conservadores ao questionarem-se por algumas vezes sobre a decisão da adoção e se esta foi correta - neste caso, os pais -, ou consultar-se constantemente com um padre (Robin Williams) para tomar suas decisões e fazer um pacto para só perderem a virgindade no encontro do verdadeiro amor - neste caso, os filhos. A impressão que fica acaba não sendo o conservador ou sequer o contemporâneo, mas apenas uma certa bipolaridade.
Aproveito a citação recente à questão das discussões sexuais da família para chegar a um dos pontos interessantes deste longa, que é esta liberdade de todos os membros da família em abordar a questão sexual na frente de todos, o que diferencia a produção de comédias familiares por contar com diversas piadas adultas - divertidas, em alguns casos - e até algumas reflexões sobre as influências do sexo para cada um ali (uma pena que elas não se aprofundam muito), mas ainda que tenha este fator de novidade e maturidade, o roteiro de Justin Zackham segue fórmulas que populam o gênero familiar, ao seguir uma estrutura bastante simplista: no início, somos brevemente apresentados às personagens e seu distanciamento; depois, presenciamos os conflitos que surgem com a situação que os reúne; e para o final, guarda-se toda a confusão reservada pelas revelações dos familiares uns aos outros, complementando com o entendimento final entre a família. E, é claro, ainda há espaço para Robert De Niro ser estapeado por algumas vezes e para que várias pessoas, em algum momento da trama, caiam num lago.
O Casamento do Ano poderia seguir sem maiores problemas - mesmo com o conservadorismo e os clichês - caso focasse apenas na trama principal e no triângulo amoroso formado pelos três veteranos protagonistas do elenco, assim tornando-se um filme que seria bobinho, mas que provavelmente funcionaria, o problema é que o longa procura criar tantas sub-tramas e situações fracas para preencher seu tempo de tela, que acaba dando uma rasteira em si mesmo, como no drama criado na relação entre Don e sua filha, Lyla, que nunca é bem explicado pelo roteiro, ou na crise que parece haver na relação entre Missy e Alejandro - justamente os que estão prestes a se casar -, passando pelo mesmo problema, ainda ficam dramas que pareciam estar prestes a se desenvolver e as mudanças repentinas no comportamento de personagens - Ellie incentiva Don o tempo todo a casar-se com Bebe para ser fiel à ela, mas acaba sendo a responsável pelo ato da traição. Fica difícil comover-se por estas situações apenas com a trilha sonora melodramática de fundo, se elas não foram bem aprofundadas. Ainda há alguns furos, como o simples fato de a família, mesmo estando fingindo ser a família perfeita para a convidada - ajudada pelo fato de a mãe biológica não falar inglês -, fala de seus problemas e do próprio fingimento por várias vezes na frente da irmã biológica de Alejandro, sendo que esta fala inglês. Não há motivações maiores para debater os méritos técnicos do filme, já que a direção e a fotografia, por exemplo, funcionam por estarem ali apenas para filmar o que acontece no roteiro, de forma burocrática e tradicional. No final, parece que a família já se rendeu ao fato de o grande plano ter dado errado, mas as aparências são mantidas.
Ainda que com tantos deméritos artísticos, O Casamento do Ano está longe de ser insuportável, simplesmente pelo fato de que um filme insuportável talvez seja aquele que se torna desagradável a ponto de você querer deixar a sessão ou fique pensando depois no quanto aquela experiência foi desagradável, e, por sorte, este aqui não se encaixa neste grupo, uma vez que é bastante breve e não será lembrado - nem por seus defeitos - muitas horas após a projeção, agradando por alguns momentos e divertindo por vários outros, apesar dos defeitos, mérito que se deve especialmente ao talento de seu elenco, que embora não esteja em sua melhor forma ou muito à vontade, ainda têm talento o bastante para humanizar um pouco suas personagens e tirar até alguma graça do fraco roteiro quando estão todos juntos em cena - o que comprova os breves risos na sequência do confessionário -, e também em especial nos poucos momentos de Robin Williams em cena - seu padre alcoólatra é abobadamente cômico - e na química entre o trio Robert De Niro, Diane Keaton e Susan Sarandon - ambos se saem surpreendentemente bem, apesar de um pouco caricatos, quando dividem a tela -, o que ao mesmo tempo nos faz questionar o motivo de eles não adicionarem um pouquinho mais de esforços à esta receita e protagonizarem longas melhores do que este, como um dia fizeram. O lamento também fica para Katherine Heigl, que diferentemente de seus colegas citados - que já construíram uma carreira antes de entrar na má fase -, mesmo ainda jovem, já emprega seu talento, beleza e carisma de sobra em escolhas, no mínimo, duvidosas.
Pouco após a sessão, viria a descobrir que este filme é a refilmagem de uma produção francesa (chamada Mon Frére Se Marie), o que me levou, embora sem ter visto a versão original, a concluir algo bastante triste, o fato de que O Casamento do Ano trata-se basicamente disto: Pegar um material original e estrangeiro, jogar um elenco estrelado e algumas fórmulas para torná-lo mais adaptado ao grande público - ou mainstream -, e americanizá-lo o máximo possível. Uma receita que pode fazer sucesso nas bilheterias - e, neste caso, arrancar algumas risadas -, mas que desvaloriza a Arte.
[Avaliação final: *¹/2]
Até a próxima.
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