terça-feira, 27 de agosto de 2013

Voo ao Passado: Enigma de Outro Mundo, O

Enigma de Outro Mundo, O
The Thing, EUA, 1982. Direção: John Carpenter. Roteiro: Bill Lancaster, com base no argumento de John W.Campbell Jr. Elenco: Kurt Russell, Wilford Brimley, Keith David, T.K.Carter. Duração: 109 min.

Você pode pensar em O Enigma de Outro Mundo simplesmente como a invasão de uma criatura (ou "a coisa" como no título original), de origem desconhecida, invade e aterroriza nosso planeta, e isto ele é, mas as reações de admiração a cada grande momento deste verdadeiro clássico do terror não viriam apenas com isso.

A sequência inicial, que traz um helicóptero perseguindo a tiros um cão que corre pela neve, revela a aura do filme desde os primeiros minutos. E quando este cão foge do helicóptero - surpreendentemente, mas depois viríamos a entender - e alcança uma estação americana, instalada na Antártida, onde é acolhido pelos oficiais que ali vivem, e depois revela-se ser, bem... A criatura - ou, ao menos, uma delas.

O interessante é vermos a revelação de que o cachorro não está ali presente apenas para tornar-se a criatura, mas torna-se uma figura para o questionamento inicial da confiança, uma vez que o cachorro inspira a confiança imediata de todos os moradores da estação, por ser um animal costumeiramente ligado aos humanos. A questão se expande para o grande ponto do filme.

Depois viríamos a descobrir que o cachorro é o portador da criatura, mas ela passa por uma fácil reprodução de modo a assumir novas formas. Neste caso específico, o cachorro foi a melhor figura para representá-lo, e seria necessário que - após descoberto como a criatura - este não deixasse a estação para não espalhar o vírus; o animal costumeiro de estimação se torna presença obrigatória, e gera também o isolamento de todos os moradores da estação. O isolamento aqui é o elemento chave, muito além da criatura em si, que após suas primeiras aparições - construído com excelência para a época, e inspirador de muitas criaturas em filmes seguintes, diga-se de passagem -, foge do foco principal, que são os dramas de seus personagens em relação à situação.

O público não conseguirá se lembrar dos nomes de todos eles - talvez MacReady, Doutor, Fuchs e Childs -, mas todos os homens presentes naquela estação saíram - ou não -extremamente modificados daquela experiência. Entre as decisões de salvar sua própria vida e fugir da ameaça iminente e mais forte ou sacrificar-se para não deixar o vírus tomar o mundo, o comportamento de cada um deles será extremamente, e com o tempo, não existem mais amigos ou confiança, existe apenas a sobrevivência. O fato de a criatura poder tomar a forma física e os comportamentos de qualquer um que contaminar torna-a ainda mais ameaçadora, mas não somente ela, e sim todos os que convivem ali, pois ninguém pode garantir - nem a si mesmo - que não está tomado pela criatura, e aí entram as questões do caráter de cada um em relação ao isolamento, que agravam seus dramas e a resistência de cada um - o surto do médico talvez seja o ponto alto deste quesito -, demonstrando satisfatoriamente suas profundidades dramáticas de modo que eles não sejam somente formas para o vírus - como em muitos filmes de contaminação acontece -, mas sim elementos ainda maiores do que o próprio, ainda que mais fracos. Ali dentro, confiar em quem normalmente você confiaria se tornará algo impossível, algo que começou com um animal e foi ao homem; o ambiente tornou-se frio, em todos os sentidos que a palavra possa ser explorada. Todos estão à prova.

A direção de John Carpenter e a trilha sonora de Ennio Morricone demonstram a discrição e pontualidade necessária para conduzi-lo com tensão, enquanto os dramas são criados - com excelência - por si próprios. A tensão e os dramas crescem, e o que já era excelente diferencia-se, tornando-se um filmaço.

Talvez aquela estação fosse uma metáfora para um mundo de 31 anos depois, onde - por diversos motivos - cada vez confia-se em menos pessoas - na estação, em ninguém, mas compare a quantidade de pessoas presentes em ambos. Vai de cada um. E é o que torna-o ainda mais genial.

[Avaliação final: *****]

Até a próxima.

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