Não é por acaso que o
texto de Anthony McCarten tenha elegido o primeiro mês de Winston Churchill
como o primeiro-ministro do Reino Unido para “resumir” a vida do sujeito: a
construção do protagonista o retrata enquanto um homem obcecado pelo conceito
de poder e pela possibilidade de praticar suas convicções políticas, na crença
nacionalista de que elas sejam o melhor para a sua Inglaterra; assim sendo,
carregar a responsabilidade de guiar diplomaticamente um país diretamente
ameaçado pelos eventos da Segunda Guerra Mundial e enfrentar a resistência até
mesmo daqueles que o cercam nesta missão se trata, provavelmente, do momento
mais deleitoso dos noventa anos de vida do homem interpretado por Gary Oldman - e a roteiro endossa sua jornada através de uma estrutura que a divide, claramente, entre um herói, seu objetivo e os múltiplos obstáculos enfrentados. Um
recorte historicamente importante e evidentemente ainda mais impactante sobre os
ombros de seu protagonista.
Ao revelar-se para o
público pela primeira vez, Winston Churchill surge envolto pelo absoluto breu
de seu quarto e é iluminado, estritamente, pelo feixe de luz do fósforo com o qual acende um charuto, ainda na cama. Uma das sequências mais prolíficas dirigidas
por Joe Wright na obra - ao lado da tomada final, que centraliza o prócer e o engrandece no parlamento -, a cena é capaz de nos apresentar a um ser humano
prestes a mergulhar seu cotidiano nos tempos mais sombrios da própria história
e encará-los. Trata-se, aliás, da primeira marca de um trabalho
sólido de Bruno Delbonnel, que compõe a fotografia de O Destino de uma Nação, quase exclusivamente em tomadas internas,
entre obscuridade e detalhadas aparições iluminadas. Naquele instante, o realizador
responsável pelo ótimo “Anna Karenina” (2013) comunica sua intenção: o
desejo de observar de perto as particularidades do protagonista, menos tocantes do ponto de vista histórico, mas potencialmente fascinantes
enquanto desmembradoras de uma das personagens mais significativas do século XX.
Sempre que trilha o caminho de um retrato mais humano, concentrado nas imperfeições e peculiaridades comportamentais do então primeiro-ministro e no tato do mesmo com as situações que o cercam e colocam em dilemas pessoais, O Destino de uma Nação consegue efetivar-se como uma narrativa interessante. Não que haja um profundo e dedicado estudo psicológico do protagonista: o desenvolvimento do roteiro preza pela humanização da figura e a narrativa adota um ritmo que torna o cotidiano daquele sujeito algo divertido de ser acompanhado, justamente por tratar-se de uma figura curiosa e singular. Há, evidentemente, a intenção de promover para a interpretação de Gary Oldman. Sob uma camada bem trabalhada de maquiagem que, verossímil, jamais toma para si o destaque que deve ser do ator, o eterno Stansfield ("O Profissional" (1994), de Luc Besson) se entrega esforçadamente à reprodução de uma figura real recheada de trejeitos atenciosos sem, no entanto, abdicar de um trabalho característico, autêntico e no qual, acima de tudo, parece divertir-se. Ainda que não se aproxime da maior atuação puramente biográfica que já nos foi oferecida - Daniel Day-Lewis, em "Lincoln" (2012), de Steven Spielberg -, a composição de Oldman, dominante no longa-metragem, ganha ares emblemáticos e deve, enfim, coroar o britânico com o Oscar de melhor ator.
Embora demonstre algumas habilidades, falta algo a este trabalho de Wright. Se acerta quando a fita "se fecha" de encontro ao protagonista, dinamizando a narrativa e criando entretenimento competente, o realizador parece sentir falta de um texto que o permita adotar uma abordagem de tom mais teatral, e derrapa sempre que deixa de lado o acompanhamento contíguo de Winston Churchill e deve mover-se em direção à trama contextual que representa, de fato, a virtuosidade do mesmo. Assim, O Destino de uma Nacao entorta-se ao perder ritmo e, especialmente, falhar na dramatização de tais situações sem entregar-se à pieguice. A sequência na qual Churchill toma um trem para "ouvir seu povo" é o mais claro exemplo disso: embora haja boa intenção, o desenvolvimento da cena, culminando no artificialíssimo "Never!", entoado por uma criança, é absolutamente novelesco e brega. Tal qual a relação entre o primeiro-ministro e sua datilógrafa, a jovem Elizabeth (Lily James, que no ano passado destacou-se no ótimo "Em Ritmo de Fuga", de Edgar Wright), notadamente forçada para reforçar o caráter "humilde e humano" do personagem principal, mas conduzida de maneira dramaticamente imatura e pouco - ou nada - convincente.
Ritmado pela trilha sonora versátil de Dario Marianelli e Vikingur Ólafsson - aquele, colaborador habitual do diretor -, O Destino de uma Nação é mais do que um enaltecimento do trabalho de seu ator principal: a exemplo de alguns de seus coadjuvantes, cujos diálogos servem exclusivamente para significar os notados impactos das ações de Churchill, trata-se de um filme que parece depender fundamentalmente dos momentos e atos mais interessantes e peculiares do personagem por este interpretado para provar-se e, especialmente, manter-se interessante.
Darkest Hour, EUA/Reino Unido, 2017. De Joe Wright. ★★½
Sempre que trilha o caminho de um retrato mais humano, concentrado nas imperfeições e peculiaridades comportamentais do então primeiro-ministro e no tato do mesmo com as situações que o cercam e colocam em dilemas pessoais, O Destino de uma Nação consegue efetivar-se como uma narrativa interessante. Não que haja um profundo e dedicado estudo psicológico do protagonista: o desenvolvimento do roteiro preza pela humanização da figura e a narrativa adota um ritmo que torna o cotidiano daquele sujeito algo divertido de ser acompanhado, justamente por tratar-se de uma figura curiosa e singular. Há, evidentemente, a intenção de promover para a interpretação de Gary Oldman. Sob uma camada bem trabalhada de maquiagem que, verossímil, jamais toma para si o destaque que deve ser do ator, o eterno Stansfield ("O Profissional" (1994), de Luc Besson) se entrega esforçadamente à reprodução de uma figura real recheada de trejeitos atenciosos sem, no entanto, abdicar de um trabalho característico, autêntico e no qual, acima de tudo, parece divertir-se. Ainda que não se aproxime da maior atuação puramente biográfica que já nos foi oferecida - Daniel Day-Lewis, em "Lincoln" (2012), de Steven Spielberg -, a composição de Oldman, dominante no longa-metragem, ganha ares emblemáticos e deve, enfim, coroar o britânico com o Oscar de melhor ator.
Embora demonstre algumas habilidades, falta algo a este trabalho de Wright. Se acerta quando a fita "se fecha" de encontro ao protagonista, dinamizando a narrativa e criando entretenimento competente, o realizador parece sentir falta de um texto que o permita adotar uma abordagem de tom mais teatral, e derrapa sempre que deixa de lado o acompanhamento contíguo de Winston Churchill e deve mover-se em direção à trama contextual que representa, de fato, a virtuosidade do mesmo. Assim, O Destino de uma Nacao entorta-se ao perder ritmo e, especialmente, falhar na dramatização de tais situações sem entregar-se à pieguice. A sequência na qual Churchill toma um trem para "ouvir seu povo" é o mais claro exemplo disso: embora haja boa intenção, o desenvolvimento da cena, culminando no artificialíssimo "Never!", entoado por uma criança, é absolutamente novelesco e brega. Tal qual a relação entre o primeiro-ministro e sua datilógrafa, a jovem Elizabeth (Lily James, que no ano passado destacou-se no ótimo "Em Ritmo de Fuga", de Edgar Wright), notadamente forçada para reforçar o caráter "humilde e humano" do personagem principal, mas conduzida de maneira dramaticamente imatura e pouco - ou nada - convincente.
Ritmado pela trilha sonora versátil de Dario Marianelli e Vikingur Ólafsson - aquele, colaborador habitual do diretor -, O Destino de uma Nação é mais do que um enaltecimento do trabalho de seu ator principal: a exemplo de alguns de seus coadjuvantes, cujos diálogos servem exclusivamente para significar os notados impactos das ações de Churchill, trata-se de um filme que parece depender fundamentalmente dos momentos e atos mais interessantes e peculiares do personagem por este interpretado para provar-se e, especialmente, manter-se interessante.
Darkest Hour, EUA/Reino Unido, 2017. De Joe Wright. ★★½
Nenhum comentário:
Postar um comentário