Um primeiro fator diferencial notável na abordagem temática de Ponte dos Espiões é a maneira como este trata a espionagem, de um modo que pouquíssimos outros títulos se propuseram a fazer, representando-a em sua vertente diplomática e política, cujo poder concentra-se mais em acordos e na estratégia de discurso do que em armas poderosas e planos recheados.
Embora não diretamente, James Donovan (Tom Hanks) também é um espião – como o primeiro plano no qual este dialoga com outro personagem, aparentemente de seu conhecimento, conduzido sempre numa estrutura de plano/contra-plano, evidenciando sua desconfiança e cautela na relação, já viria a sutilmente denunciar -, mas um cuja principal arma são os princípios, a humanização e, sobretudo, o discurso. Eis um agente mais “nosso”.
No entanto, este se destaca mais evidentemente por ir além em sua visão de mundo – e esta, sim, tem muito mais a dizer do que a trama parece representar numa observação inicial. A contextualização no período da Guerra Fria, quando o conflito militar e político se deu essencialmente num caráter ideológico e, neste âmbito, foi capaz de envolver uma parcela majoritária da população civil, é fundamental para o desenrolar da narrativa e seus comentários – quase despropositais de tão sensíveis - sobre a nossa atualidade global (especialmente em nosso país, vejam só): vivia-se um cenário de absoluta intolerância, no qual ódio e asco eram imediata e impiedosamente despejados pelas pessoas sobre quaisquer outras que pensassem diferente; e ai, de quem ousasse agir de maneira humana, colocando o senso de justiça e a tolerância acima de diferenças ideológicas – poderia se tornar ferozmente ameaçado, como ocorreu com nosso protagonista, James. Este cenário parece cada vez menos distante do nosso senão por alguns anos de diferença – e Ponte dos Espiões é um filme que, como seu protagonista, clama por acrescê-lo de mais humanidade.
Ponte dos Espiões ★★★★
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